sábado, janeiro 13, 2007

LER JORNAIS É... SABER MAIS



Sexualidade
O trabalho aumenta
e o sexo desaparece

In: Correio da Manhã de 2007-01-07 - 00:00:00
Texto: Diana Ramos
Ilustração: Ricardo Cabral
Vivem alimentados pelo ego, o prazer maior do seu dia-a-dia.
Vencem no trabalho, sobem a pulso a escadaria do sucesso e sentem no bolso a recompensa da dedicação.
O relógio não pára, afinal, o tempo é precioso, por isso dedicam entre 10 a 14 horas diárias à empresa que lhes rouba a vida. A perigosa sedução do trabalho intensivo fê-los ganhar um nome: ‘workaholics’, ou melhor, viciados em trabalho.
A factura, essa, é pesada: arruínam a vida sexual e, em grande parte dos casos, o casamento ou uma relação de anos.
É no anonimato que os casais ou amigos próximos recordam o pesadelo de uma relação destruída pela pressão das obrigações profissionais. Sandra e Tiago (nomes fictícios) não escaparam ao crivo.
Os ordenados eram chorudos, quanto mais não seja para a realidade portuguesa.
Todos os meses caíam na conta de cada um não menos que 2500 euros.
Ela é engenheira química, mas toda a vida deu aulas. Ele é engenheiro de sistemas electrónicos, professor num instituto superior e técnico especializado numa empresa dedicada às novas tecnologias.A faculdade juntou-os e, após nove anos de namoro, veio o casamento.
Entre projectos, congressos e seminários, muitos deles no estrangeiro, Tiago passava mais tempo fora do que com Sandra. E nem os dois filhos salvaram o naufrágio do casamento.
PROFISSÕES DE RISCO PARA O DESEMPENHO SEXUAL
Sylvia Ann Hewlett e Carolyn Buck Luce as responsáveis por um estudo recente, publicado na última edição da ‘Harvard Business Review’, que lançou o alerta sobre as ‘profissões de risco’ e os seus efeitos no mau desempenho sexual dos casais.
Segundo Sylvia Ann Hewlett, os grandes executivos, gestores qualificados ou técnicos em altos cargos empresariais “estão a destruir a sua vida privada” e a pagar o preço da ambição pessoal e excessiva dedicação ao trabalho “pondo em causa a sua saúde e bem-estar”.
Os números não enganam: das centenas de pessoas entrevistadas, 66 por cento “adoram aquilo que fazem”. Mas mais de 50 por cento dos viciados em trabalho – no topo da lista entre os profissionais mais bem pagos do mundo – não esconde que tem uma vida sexual altamente frustrante.
A culpa, claro está, é do trabalho, admitem.
Vivendo do prazer do ego, 46 por cento dos ‘workaholics’ em topo de carreira dizem que “os seus empregos não permitem manter uma relação forte/estável com o marido/mulher ou companheiro(a)”.
Mais grave ainda: são 45 por cento os que confessam “não ter sequer forças para conversar com o parceiro” quando chegam a casa.'
NÃO SENTEM PRAZER NA RELAÇÃO ÍNTIMA'
A psicóloga clínica Catarina Mexia, com larga experiência na terapia conjugal, acredita que “estas pessoas não sentem prazer na relação íntima”. “A intensidade de uma relação profissional pode ser muito grande, mas a forma como nos damos ao outro na relação afectiva tem de ser sempre diferente”, explica.Ao olhar para os números, a psicóloga clínica admite que a “gratificação vem do sucesso profissional que alcançam”.
“Esta fuga tem aspectos positivos em termos de rentabilidade profissional, mas não tem grande aplicabilidade quando se trata de lidar com o companheiro, que espera que a pessoa se dedique a si de corpo e alma”, diz a terapeuta.Para Catarina Mexia, “o comportamento não é normal”, de acordo com aquilo que são os padrões tradicionais, mas “hoje em dia as pessoas aprendem a tirar prazer de outro tipo de coisas”.
E acrescenta: “Também não é normal que as pessoas cheguem a casa e se agarrem à internet em vez de privilegiar o contacto e a conversa com a companheira(o), que podia acabar numa relação sexual.”
A psicóloga coloca a questão e adiciona a importância da evolução tecnológica à problemática: de que fogem, afinal?
Não sei até que ponto é que estas pessoas não são os filhos da era dos computadores, aqueles que aprenderam a não valorizar as relações interpessoais .”
Apesar deste tipo de situações surgirem “com bastante frequência” no seu consultório, Catarina Mexia recorda com maior facilidade os conflitos de “um casal que trabalhava na área das comunicações”. Conheceram-se na empresa, partilhavam os mesmos gostos e ritmos.
“Quando o trabalho dele começou a exigir constantes viagens ao estrangeiro e o dela a exigir muita pressão mas ficando por cá, as coisas deixaram de ter tanta piada”, conta a psicóloga.
“Ela passou a entrar em casa e a encontrá-la vazia, as coisas deixaram de fazer sentido.” Hoje em dia, “são bons amigos”, a exemplo do passado em que ainda trabalhavam a ritmo moderado, “mas já não são casados”.
Quanto à ausência de conversa e intimidade entre o casal, provocada pelas longas ausências de um dos elementos, “se ambos estão afinados pelo mesmo diapasão, se são os dois workaholics e a relação a dois é só uma forma de evitar a solidão, as coisas funcionam”, diz Catarina Mexia.
O pior é quando um dos lados da relação valoriza a presença do companheiro. “A ausência de conversa é uma forma das coisas irem por água abaixo.”
ESTAR FORA DE CASA AUMENTA DESEJO
Os viciados em trabalho podem ser autênticas bombas na cama: a culpa fá-los compensar as parceiras.
A conclusão faz parte de um estudo feito a cem casais pela American Psychological Association, mas atenção: “Aplica-se apenas a trabalhadores intensivos, mas não aos viciados que não se interessam pela família.”
Elas são donas de casa ou têm um emprego das 9 às 5.
Eles são homens de negócios que passam mais de dez horas diárias no trabalho.
Vêem-se poucas vezes, mas quando se encontram soltam faíscas: “Pode ser consequência da culpa”, dizem os investigadores.
“Passam muito tempo fora de casa e quando estão com a mulher fazem um esforço para a satisfazer sexualmente.”
NÚMEROS QUE ARRUÍNAM RELAÇÕES:
- 50% dos viciados tem uma vida sexual frustrante e culpa o trabalho .
- 46% admitem que o emprego não lhes permite ter uma relação forte e estável com o seu companheiro.
- 45% diz não ter forças para sequer conversar ou tocar o parceiro quando chega a casa, após o trabalho.
- 77% confessam que têm dificuldade em manter a casa em ordem.
- 'Empregos radicais: A Perigosa Sedução da Semana de 70 horas’, é um estudo do Center for Work-Life Policy, de Sylvia Ann Hewlett e Carolyn Buck Luce
SEREI VICIADO?
São muitas as pessoas que passam por dificuldades, mas poucas aquelas que conseguem ler os sinais de alerta. Descubra qual o perfil dos viciados em trabalho.
EXIGÊNCIA PROFISSIONAL
Os viciados em trabalho ocupam habitualmente cargos de elevada responsabilidade, nas áreas da Economia, Direito, Saúde, Media e Tecnologias.
São muito qualificados e bem pagos, mas enfrentam uma feroz competitividade interna. Descuram o crescimento dos filhos.
SEM HORÁRIOS
O relógio começa a contar ao início da manhã, mas apenas marca hora de entrada.
Na maioria dos casos, o trabalho rouba 60 horas semanais.
Para os mais novos, com sede de mostrar trabalho, a carga horária pode chegar às 100 horas.
Fins-de-semana, não existem.
FÉRIAS, NEM VÊ-LAS
Para os ‘trabalhadores incansáveis’ as férias são uma raridade.
Mais de metade dos viciados não tira mais de 10 dias por ano.
E mesmo os poucos dias de descanso são quase sempre interrompidos por questões de trabalho, que se sobrepõem à atenção dispensada à família.
VIAGENS SUCESSIVAS
Se não estão enfiados num escritório estão dentro de um avião a caminho de mais uma palestra, conferência ou reunião.
Em sete dias, quatro ou cinco são passados a viajar.
Quando tal não é possível, a alta tecnologia de comunicação põe-nos em contacto com qualquer parte do Mundo.
SEXO E PODER
(A opinião da Jornalista Dulce Garcia)O secretário de Estado norte-americano Henri Kissinger costumava dizê-lo a torto e a direito: “O poder é o verdadeiro afrodisíaco”.
Esqueceu-se, porventura, de lhe acrescentar uma frase: mas só quando é exercido pelos homens.Sexólogos, sociólogos e outros ‘ólogos’ que têm queimado tempo e pestanas a decifrar o comportamento humano, estão fartos de explicar por que é que as mulheres correm atrás de homens poderosos.
Já era assim na idade da pedra, quando eles vestiam peles em vez de fato e gravata, e arrastavam para casa troféus cobertos de sangue.
Tem a ver com a preservação da espécie (tem sempre).
Elas querem o melhor companheiro porque desejam reproduzir-se.
Eles também não fogem a esse mandamento biológico mas aproveitam para se divertir um bocado.
Se o status é um perfume irresistível para os narizes femininos, o trabalho é a chamada flauta mágica – homem ocupado quer dizer mais cartão de crédito, mais compras e menos tempo a aturar-lhe as manias. Também pode querer dizer menos sexo, é verdade, mas a sua prática decorrerá sempre nos melhores décors: bons hotéis, luxuosas estâncias de esqui, ilhas paradisíacas e por aí adiante.
O problema é quando são elas a mandar. Sim, é um problema, porque eles não querem mulheres poderosas. Deus os livre. Ricas sim, mas dentro de casa, prontas para dar colo e ordens à empregada.
E se o casal se constituiu em pé de igualdade, ela nunca pode ganhar mais do que ele.
É uma heresia, uma pedra no sapato, um Viagra ao contrário.
Daí que trabalho a mais seja sinónimo de muita companhia para eles, e de muita solidão para elas; um chamariz de amantes para os cavalheiros; um cinto de castidade para as damas.A fazer fé nos relatórios sobre o peso das mulheres no mercado de trabalho – dados das 50 maiores empresas a operar em Portugal, cotadas em Bolsa, revelam que o número de mulheres em cargos superiores é ainda um terço do número de homens – temos um país em franca actividade sexual.
É verdade que elas já estão em maioria nas escolas e nas universidades, mas enquanto não chegarem às empresas e ao Parlamento, eles podem dormir descansados.
E acompanhados.

Sem comentários: